quarta-feira, 22 de agosto de 2018

HARVEY, D. Diecisietecontradicciones y el fin del capitalism


Introdução

Diante de crises do sistema capitalista, como o “estouro” da bolha imobiliária ocorrida em 2008, Harvey (2014) coloca em discussão 17 contradições do sistema capitalista. O autor põe em discussão os fundamentos das crises do sistema capitalista e como isso se reflete à sociedade, elaborando pressupostos a uma vida pós-capitalista.
            Harvey propõe, com base em Karl Marx, que se deve analisar as contradições para então elaborar-se a análise das crises. Já que ele entende o sistema capitalista como cíclico e que as crises sempre irão existir dentro do sistema capitalista. Para isso ele discute e propõe 17 contradições. 

Sobre o valor de uso e de troca (bônus track)

            A primeira contradição que Harvey apresenta se refere ao valor e uso e ao valor de troca. De acordo com o autor, a mercadoria tem um valor de uso e um valor de troca.
            Harvey sustenta que o valor de uso se refere a uma necessidade básica para a manutenção da vida humana, por exemplo, o ato de comer para saciar a fome. Enquanto que o valor de troca se refere à quantidade monetária para se adquirir algo. Seguindo o exemplo, é o quanto seria necessário ter-se de unidade monetária para saciar uma necessidade fundamental, como a fome.
            Harvey aposta, seguindo a sugestão de Marx, que há uma contradição entre valor de uso e valor de troca. O problema está no momento quando se “financeiriza” o valor de uso, potencializando o valor de troca em detrimento do valor de uso.
            O autor demonstra o exemplo da especulação imobiliária sobre as moradias. Para ele, o valor de troca passou a ser predominante na sociedade capitalista. Já que as pessoas começaram a tratar a moradia não mais como uma necessidade de morada, mas como poupança ou investimento de curto e longo prazos. Também argumenta para o “olhar” sobre a oferta e demanda, uma vez que o valor de uso pode se tornar escasso quando da pouca oferta, auferindo, assim, valores grandes sobre a troca diante da pouca disponibilidade da mercadoria, por exemplo.
            Sugere-se que deve haver um equilíbrio entre valor de troca e valor de uso, mas o que ocorre é que o sistema capitalista tende a especular e a financeirizar tudo. Dessa forma, o autor propõe que se deve focar numa proposta para o valor de uso, tentando reduzir o papel especulativo do valor de troca sobre o valor de uso.
           
Sobre o crescimento acumulativo exponencial sem fim

Harvey coloca na contradição 15 que a remuneração para o capital aumenta e que esse crescimento assume a forma de um gráfico exponencial com o passar do tempo. Ele coloca que o capital tem buscado taxas de remuneração cada vez mais altas. É cada vez mais emblemático que, considerando o exemplo das proporções de remuneração apontadas pelo autor, por exemplo, se um investimento na década de 1970 rendia cerca de 600 bilhões de dólares, hoje é preciso encontrar canais lucrativos de investimentos na ordem de 3 trilhões de dólares e que daqui a 20 anos, mais ou menos, será preciso taxas de lucros da ordem de 6 trilhões para os investimentos.
            O autor aponta que o crescimento exponencial e a acumulação sem fim são um problema, dado que cada vez mais teremos maiores números na captura de remunerações por renda, ao invés de lucros ou taxas atrativas de investimentos na produção de coisas materiais, como alimentos, que nos dias atuais já não são tão atrativos de seinvestir financeiramente como eram na década de 1970.
            O autor argumenta sobre a teoria de Malthus, na qual colocava que a taxa de população mundial tende a crescer a um ritmo exponencial ou geométrico, enquanto a produção de alimentos num ritmo aritmético. Harvey coloca que Malthus não se atentou para o progresso tecnológico na agricultura e nem pensou na possibilidade da diminuição demográfica. No entanto, Harvey trabalha um ponto interessante do pensamento de Malthus: que é colocar para análise a evolução demográfica com a evolução da acumulação de capital.  Harvey coloca o seguinte problema: nos primeiros momentos da história do capital, o rápido aumento da população ou de uma vasta reserva de trabalho assalariada inexplorada e ainda não urbana, sem dúvida, ajudou a manter uma rápida acumulação de capital (Harvey, 2014, p. 227), mas que, por outro lado, por exemplo, a taxa de crescimento da economia não tem acompanhado a taxa de desemprego e a taxa de decrescimento da população. A partir disso, Harvey demonstra que o crescimento da acumulação de capital se apoiará cada vez menos no crescimento demográfico e mais sobre a taxa de desemprego.
            Mas, se o capital se apoia no mais valor e na busca por benefícios, qual seria a razão e lógica atual para se obter mais valor sobre o que se tinha no princípio? Harvey aponta que a resposta está na privatização dos ativos públicos, na retração dos direitos sociais e na participação privada no provimento dos serviços públicos.  Para o autor, a acumulação exponencial só se mantém na medida em que o capital vai cada vez mais penetrando na vida social e econômica das pessoas. Por outro lado, mudanças significativas de consumo por parte da população têm sido presenciadas, já que os bens de consumo são cada vez mais projetados com uma certa obsolescência programada.
            De acordo com o autor (p. 235 – 236), quando a rentabilidade do investimento nos ativos produtivos caiu na década de 1970 houve a mobilização de capitais para as instituições creditícias, que cederam empréstimos a países do terceiro mundo. Naquele momento, a ideia era que o capital excedente encontraria remunerações superiores aos disponíveis no mercado, Harvey denomina esse capital rentista de classe parasitária. Qual então o perigo dessa contradição para a sociedade? Harvey aponta que os recursos naturais são finitos e que o consumo não pode crescer de forma fictícia ou descolada da realidade de disponibilidade na natureza. Além disso, a população necessita de bens materiais básicos para a vida. Dado que o capital busca proporções de remuneração cada vez maiores, é tenebroso pensar no abandono de investimentos no capital industrial e o soerguimento da classe parasitária.
           
Sobre tecnologia, trabalho e disponibilidade humana

            Nessa contradição, Harvey demonstra a contradição fundamental entre o uso da tecnologia aplicada ao trabalho com a disponibilidade humana para o trabalho. Os benefícios do desenvolvimento tecnológico não têm sido compartilhados a todos os habitantes do planeta e que, na verdade, o objetivo do desenvolvimento tecnológico é a experimentação de um assombroso aumento da produtividade do capital.
            Harvey coloca que as empresas capitalistas estão submetidas a uma competição mútua, em que elas trabalham para elevarem suas eficiências e produtividades individuais, tentando obter benefícios maiores que as suas competidoras (p. 102) no mercado e que os resultados disso são saltos tecnológicos de distintos setores. No entanto, Harvey atenta para a questão do monopólio e da propriedade intelectual, como os royalties.
            Dito isso, Harvey coloca que o capital tem sido beneficiado do avanço tecnológico no capitalismo, em que ele se alimenta ferozmente por meio da destruição criativa das tecnologias - inovação.  Para o capital, a tecnologia se converteu num campo especial da atividade empresarial, donde se sucederam buscas pela maior invenção e inovação nos sistemas de produção, circulação, consumo, governança, poder militar e vigilância (p. 104). De acordo com o autor, desde meados do século XIX a compreensão científica há experimentado os avanços tecnológicos como o microscópio e o telescópio, mas que, por outro lado, as novas tecnologias têm se apropriado cada vez mais dos conhecimentos científicos e que se há promovido uma verdadeira inserção desses no núcleo da atividade empresarial para o impulso da inovação tecnológica.
            Harvey fala que o controle sobre o processo de trabalho e o trabalhador tem sido decisivo para a capacidade do capital de manter a rentabilidade e a acumulação de capital (p. 111). Durante toda a história, o capital há inventado, inovado e adotado formas tecnológicas cujo o principal propósito é aumentar o controle sobre o trabalho. Assim, otimização e robotização são interiorizados no processo de produção das mercadorias, em vias de substituir o trabalho vivo pelo morto. É por essa via que Harvey coloca que os robôs não se queixam do pagamento de salários e nem do tempo de trabalho, por exemplo, mas que, por outro lado, robôs não têm a propensão a consumir mercadorias.
            Harvey aponta que o desastre econômico pode ocorrer caso não haja população suficiente a comprar as mercadorias produzidas pelas empresas. A competição entre empresas por meio da inovação tecnológica e pela redução dos custos de produção tem, de certa forma, eliminado diversas profissões e empregos e, por outro lado, estimulado a criação de diversas outras. No entanto, ao citar Henry Ford, Harvey demonstra que: permitir que os empregos sejam eliminados aos montes sem nenhum plano concreto de recriação ou mitigação pode condenar o sistema capitalista ao desastre (p. 113). Já que os consumidores impulsionam o mercado, se uma fração substancial de empregos for destruída de onde virá a demanda que movimenta a circulação do mercado?
            É preciso se atentar para o surgimento de uma parcela revoltosa da sociedade que, sem disponibilidade de emprego por parte das empresas, pode vir a ser um problema ao funcionamento do capitalismo. Também, a contradição entre produção de valor, por um lado, e inovação tecnológica que tente salvar o trabalho vivo em grande escala, por outro, há encontrado um território cada vez mais perigoso ao se ver-se afetado por uma crescente parcela da população sem previsíveis oportunidades de emprego; o que é um problema para a reprodução do capital.
           


A propriedade privada e o Estado capitalista

            Harvey começa a contradição abordando a ideia de que o Estado faz a mediação das relações entre consumidores e vendedores, uma vez que o valor de troca pressupõe a garantia da existência dos direitos de propriedade individual sobre as mercadorias e sobre a moeda. Portanto, o papel do Estado aparece, por exemplo, como garantidor do direito de propriedade privada.
            A imposição e/ou consenso dos direitos de propriedade privada depende da existência de poderes estatais de coerção e do ordenamento do sistema jurídico, que codifica e define uma série de obrigações contratuais. Dessa forma, a sociedade está submetida ao poder coercitivo do Estado por meio do monopólio do uso da força. O que caracteriza dizer que as ações do Estado são ancoradas num sistema jurídico ou contrato socialmente imposto ou aceito pela sociedade, sendo a vigência desse sistema garantida através do Estado. Cabe ao Estado, por meio do poder coercitivo, definir, regular, codificar e dar forma legal aos direitos e vínculos sociais que caracterizam uma determinada sociedade (p. 56). Assim, o autor coloca que o direito de propriedade individual está alicerçado numa cultura individualista da sociedade.
            Diante disso, o autor lembra que, além do sistema jurídico, o Estado tem de governar e administrar a moeda e os interesses da população. Ao largo de colocar o Estado como mediador na resolução de problemas referentes às falhas de mercado, o autor coloca em pauta que tanto a burguesia quanto o proletariado têm, eminentemente, encampado o discurso do direito à propriedade individual, uma vez que é garantida, aparentemente, a posse e a acumulação de bens materiais.
            O problema, seguindo o raciocínio de Harvey, é que o Estado capitalista se compromete a fazer manobras que beneficiem a acumulação de capital. Dado que, desde o aparecimento do primeiro Estado-Nação do século XV em diante (p. 58), a construção do Estado tem se apoiado na necessidade por recursos econômicos para garantir-se belicamente na ampliação ou manutenção de seu território. Assim, nos dias atuais, a riqueza e o status de poder se convertem num instrumento crucial para o posicionamento geopolítico e geoeconômico de influencias no mapa mundial, onde o poder competitivo das empresas no mercado está atrelado com a gestão do monopólio do sistema monetário e fiscal do Estado.

Referência bibliográfica


HARVEY, D. Diecisietecontradicciones y el fin del capitalismQuito - Equador: Instituto de Altos EstudiosNacionalesdelEcuador (IAEN), 2014, 296 pp.

O amor existe?



Várias pessoas se perguntam sobre a existência do amor, se ele existe ou se pode ocorrer possibilidade ao encontro desse sentimento nos dias atuais. A resposta é refém das condições que envolvem várias variáveis, como da efemeridade do tempo aos desejos e prazeres, porque vivem em constantes oscilações, se metamorfoseando conforme a combinação das necessidades dos seres.
No percorrer do tempo começa-se a perceber a busca pela existência do amor. Talvez a pergunta devesse ser outra, por exemplo, existem pessoas que se complementam? A procura por excelência, no que toca ao amor, nem sempre é o que se espera daquela pessoa que tanto se enamora. Dessa maneira se extrai os equívocos aos sentimentos, fuga às novas investiduras ao amor por ocorrência ao medo do novo errar, a convivência social e a realidade que engrandece a entrega dos seres ao prazer que se desencontra com o desejo a longo prazo, descaracterizando a busca por sucessivos prazeres durante a vida numa relação a dois, como boas conversas ou o conviver aventuras recíprocas que a relação conjugal possa permitir. 
Durante o tempo percebe-se o impreciso quando se admira alguém por atos que se extinguem em prazos que variam conforme os desejos e prazeres. A descoberta do sentimento amor envolve reciprocidade à abertura do desejo de sentir prazer a um ato (ou atos) de se estar em proximidade a algo que se deseja e que conceda prazer quando adquirido, estando apto a saciar as vontades e necessidades do ser.
A efemeridade dos desejos e prazeres pode arriscar o sentimento de amor ao engano. Isso lembra um investimento, no qual se aplica um determinado valor num objeto para depois colher prosperidade. Todo investimento precisa de cuidado, uma análise crítica deverá ser feita para as possíveis perdas no futuro, como também para os ganhos.
Sabe-se que todo investidor está sujeito aos riscos, podendo ele ficar pobre ou rico ao primeiro aceno da aurora. Talvez seja chulo comparar sentimento com algo que envolva investimentos. Porém pode fazer sentido quando se admite algum fracasso. Não admiti-lo é o mesmo que fanar diante das mazelas; é estar tácito por natureza, consequência de alguma enfermidade adquirida; porque se faz ilação com base nos antigos relacionamentos. Essa estimativa é o medo, resultado de alguma frustração ou fracasso, esse sentimento é o selo que peia e que leva ao óbito qualquer possibilidade de ser terno e simpático às novas sensações, isto é, aos novos investimentos.
No primeiro amor e quando o medo é recalcitrado faz-se emergir os serviços da deusa Afrodite e de seus assistentes Eros e Hímero. Hímero, que de olhos vedados lança “as primeiras setas ao acaso”, desperta o desejo efêmero do amor. Eros, que deriva “herói”, determina quando do amor ser mais forte que qualquer prazer; amor como sacrifício, mais imperioso que a própria vida. É este que aprisiona os seres às novas inclinações ao amor (para quem o teve), do amor entrelaçado com a primeira fonte de sentimento, que torna as pessoas dependentes das demais experiências que a vida pode ou possa oferecer; é ele quem decide as aptidões futuras acerca do amor e também a conquista do desejar o outro ser para si a longo prazo. Comparando com os investimentos, é o passado frustrado que torna o investidor mais cauteloso para as novas intenções de investidas. 
Até aqui se entende que passado preserva o futuro, porque é isto que o texto propõe, o passado pode ser modificado e retificado. Mas, o que seria o sentimento inicial ou a primeira fonte de desejo? Algumas respostas são possíveis encontrar em seu consciente, porque todo ser possui alguma feição pré estabelecida a saciar o prazer imediato, que antecede o desejo, logo, as pessoas já devem ter se iludido com sensações sem efeitos contínuos. 
As pessoas se abstêm de qualquer possibilidade de amar intensamente, seja pelas experiências próprias como pelas indagações da sociedade, o famoso adultério, por exemplo, porque não quer dar tempo ou porque não há tempo para se chegar à descoberta desse sentimento. No entanto, algumas outras barreiras para a descoberta do amor são expostas: “falta de coragem” e medo em arriscar. Fica a pergunta, porque há medo de algo que pouco se conhece e porque falta coragem em conhecê-lo? A psicologia talvez tenha várias conclusões, mas a explicação que cabe aqui é que a sensação do corpo frente à primeira fonte de prazeres, antecedente ao desejo, ocorre. Essa é uma sensação de conforto e paz, há uma taquicardia devido à presença da pessoa no qual tanto se deseja. É a felicidade interior que está prestes a emanar do ser. É esse sentimento que aflora as setas do Hímero. Voltando aos investimentos, um investidor dificilmente abandona seu ofício após uma crise ou erro. Ele tenta a todo o momento salvar seus investimentos e, mesmo fracassado, insere novas investidas.
É esse o espírito que está nas pessoas. O que faz o investidor capaz de correr riscos? O que o torna invulnerável ao medo? Analisando alguns pensadores como Freud, Reich e Shakespeare, pode-se afirmar que o medo é a insegurança que o homem adquire de uma relação longo prazo, ou e, as experiências que o homem vai conquistando ao longo da vida, dotando-o da diferenciação de prazer e desprazer num contexto social.
Portanto, é o prazer que torna um investidor apto às novas investiduras; porque se não fosse de sua função na sociedade, que foi descoberta após a experiência de prazer e desprazer que lhe concede funções psíquicas de desejo ao maior sucesso financeiro, esse não seria investidor. O medo à entrega e a falta de coragem para investiduras ou novas investidas ao sentimento de prazer ao amor apenas enfraquecem Hímero, a falta do fluído cósmico que une o corpo à vontade de desejo a uma relação entre corpos debilitam Eros e ambos cessam qualquer possibilidade de catarse pela deusa Vênus. Sendo a primeira a principal tanalogia do amor.
O que torna potenciais palavras de amor ao sentimento? A juventude foi “acelerada” pelo tempo e perderam-se as noções das melodias e acordes que tanto se deu valor. Os antigos cotidianos das trocas de prazeres e à necessidade do ser estar envolvido à relação conjugal, durante os períodos áureos das formações familiares, foram trocados por meras palavras que se inflam em sentimentos vagos em busca de conquistas de apenas uma noite de verão, enquanto os demais concentram esforços às noites de luas cheias em vão a dois, ficando restritos à efemeridade do desejo e do prazer, ou seja, se confundem e não se destacam, se assemelhando ao prazer natural ao sexo das demais espécies de animais.
 Assim se desmonta as convenções tradicionais que respondem o encontrar amor dito verdadeiro. É possível haver verossimilhança à inflamação do envolver prazeres, desde que haja o encontro do desejar às trocas de prazeres, isto é, espera-se que se admita, em situação, o desejo de se conjugar os prazeres e, em condição, que o tempo permita que não se leve a falhar os prazeres. Exemplo de sentimento que inclina ao fracasso se situa no desejo ao corpo do outro e que dele se espera o prazer, sabe-se que o organismo está sujeito às perdas durante o tempo e, logo, se entende a efemeridade do cultuar o prazer em desejar, que coloca em cela as relações longo prazo.
O amor não responde ao tempo, mas às necessidades que se busca dentro das escalas desse tempo ou às variações psicológicas que cada ser possui, como o gostar e admirar os mesmos objetos ou realizar algo que lhes permitem relações que produzam o ecoar da saudade, que só é descoberta após a morte do outro ser, por conta da não descoberta dos potenciais valores dos prazeres que, descobertos a tempo, sejam engrandecidos e nobres aos dois, se tornando eternos. Dessa forma a confusão dos desejos com os prazeres pode ser vencida e o ser poderá se antevir ao futuro, prevendo os desejos do outro e centralizando suas vontades às necessidades à busca do amor dito verdadeiro.





quinta-feira, 26 de abril de 2018

Um breve resgate da formação socioespacial brasileira (Fichamento)


Às ocultas, o modo de regulação do espaço é realizado pela égide hegemônica, porém hoje emerge a evidenciação da consciência social, liberada pela reestruturação do espaço. A entrada do Brasil no mercado mundial evidencia uma nova organização e regulação social, revelada pela insurgência de novos sujeitos e da manutenção das antigas ações/intenções dos agentes hegemônicos sobre os espaços nacionais (MOREIRA, 2012).
O bandeirantismo foi o irradiador da ocupação do espaço brasileiro, ator de expansão. As tropas bandeirantes procuraram conquistar espaços, motivadas pela busca de materiais preciosos. Por onde passavam deixavam caminhos abertos e penetravam pelas calhas dos rios, dando origem a pontos de parada, que originaram as vilas e manchas de cultivos, onde foram brotando os centros de referência e ocupação do território. Os ciclos de assentamento desenharam a evolução da ocupação no território. Apontando ciclos diferenciados no espaço-tempo, como os seis ciclos: Pau-Brasil, Cana-de-Açúcar, mineração, gado, borracha e café. O avanço dos assentamentos ocorreu pelas trilhas abertas pelos bandeirantes, ora pelos rios e interflúvios, ora pelas grandes superfícies planas do planalto central. De acordo com Moreira (2012), vigora o ciclo do Pau-Brasil nos séculos XVI e XVII, e tem por domínio de abrangência o litoral e a faixa estreita da franja costeira de Mata Atlântica do Rio Grande do Norte ao Rio de Janeiro. A exploração do Pau-Brasil deixou heranças profundas na paisagem, como a depredação do meio ambiente, deixando para trás terras arrasadas.
A sociedade agrícola se efetiva a partir do ciclo da Cana-de-Açúcar. O modelo, de caráter agrário, encontrará seu potencial mercantil que virá a subsidiar o conteúdo social da formação espacial brasileira, num contraste com a essência mineiro-urbana da formação colonial hispânica. O caráter agrário da formação colonial brasileira é trocado pelo mineiro-urbano após a descoberta de metais preciosos em Minas Gerais, encerrando a face do bandeirantismo e impulsionando a de expansão de gado. Moreira (2012) aponta que o ciclo do gado é a culminância das ondas de deslocamento de rebanhos das duas áreas extremas: sertão do Nordeste e os campos do Rio Grande do Sul, atraído para o planalto central mineiro pela demanda de alimentos criados pelo ciclo da mineração. É o ciclo do gado que, na prática, sedimenta e valida como espaço o território da colônia estabelecida pelo Tratado de Madrid de 1730. Dentre outros ciclos, o da borracha e o do café; o primeiro que vai ocorrer na região de florestas do vale do Amazonas, em paralelo os do Pau-Brasil, cana e dos metais preciosos; o segundo no fim do século XIX aos meados do século XX, com epicentro no planalto de São Paulo sedimentaram, também, as ocupações no território. Mas, ambos os ciclos tiveram caráter concentrador e excludente, levando a sequências de movimentos insurrecionais ao longo dos séculos, como as que se desdobraram nas comunidades indígenas e quilombolas. De um modo geral, são experiências na constituição de um modelo de sociedade, que vicejam na fímbria da instituição do modelo latifundista-escravocrata, predominante em toda a evolução da formação espacial brasileira (MOREIRA, 2012).
Ao esgotar e ultrapassar as fases dos ciclos, o Estado nacional se torna o doravante regulador do desenvolvimento rumo à industrialização. A reestruturação regional promovida pelo Estado ocorre através das heranças que os ciclos deixaram nos espaços, e terá fundamental desenvolvimento da indústria, dado o caráter de uma divisão territorial do trabalho que está já implícita nessa divisão regional. Assim, o Estado vai procurar extrair as divisas de exportação necessárias às indústrias. Aquela conversão espacial pouco organizada entre os ciclos, agora se dissolve a fundo para as indústrias do sudeste. O resultado é o movimento desigual e combinado que passa a reger a nova formação espacial, desigualando e invertendo o poder de produção do campo para a cidade. É a partir desse momento que o arranjo capitalista se expande, de modo que a antiga regulação agroexportadora se desfaz num movimento de desmanche e remonte do Estado nacional. Depois das transformações no espaço, sequenciadas por divisões do trabalho, a reordenação espacial se confunde com o conceito de modernização conservadora do território, e tem como marca temporal, segundo Moreira (2012), a década de 1970.
Esse período é marcado pela modernização da agricultura, e a redistribuição territorial da indústria ocorre pela (des)patrimonialização e desestatização, que privatiza a gestão do espaço. É no pós década de 1980 que o Estado se torna agente do mercado, passando às empresas a fatia e as estratégias de ocupação e regulação do espaço nacional, dissociando a formação socioespacial brasileira do projeto de país autônomo, determinando seu conteúdo nos dias atuais, onde a socialização das riquezas e privatização dos lucros se combina num mix de representações nas atuais ações sobre os espaços nacionais. Assim gerida essa formação socioespacial, embaralhando noções como cidade, região, rural e urbano, entre outras.

Referência

MOREIRA, R. Formação espacial brasileira: uma contribuição crítica à Geografia do Brasil. RI: Consequência, 2012.

quinta-feira, 14 de janeiro de 2016

Os fins justificam os meios...

Maquiavel (QUIRINO, 2003)

Segundo Maquiavel, o início do conflito se concentra na história clássica em seu "diálogo" com os homens da antiguidade e suas práticas levam-no a concluir que por toda a parte e em todos os tempos, observa traços humanos imutáveis. Portanto, segundo Maquiavel, os homens são ingratos, volúveis, simuladores, covardes ante os perigos, ávidos por lucro. Essas atribuições negativas compõem a natureza humana e mostram que o conflito e anarquia são desdobramentos necessários dessas paixões e instintos malévolos; daí deve-se extrair as causas e os meios utilizados para enfrentar o caos resultante da expressão da natureza humana. Dessa forma Maquiavel sustenta o seu argumento que nessa variação encontra-se o âmago da capacidade criadora humana e, portanto, da política são os tempos de duração das formas de convívio entre os homens. O Poder político tem, pois, sua origem mundana, nasce da própria malignidade que é intrínseca à natureza humana, que constituem em avareza, ira e estupidez. Além disso, o Poder aparece como a única possibilidade de enfrentar o conflito, ainda que qualquer forma de domesticação seja precária e transitória, não há garantias de sua permanência. A perversidade das paixões humanas sempre voltam a se manifestar, mesmo que tenham permanecidas ocultas durante algum tempo.


Maquiavel sugere que há basicamente duas respostas à anarquia decorrente da natureza humana e do confronto entre os grupos sociais: o principado e a república. Assim, quando o governo (nação) encontra-se ameaçado pela corrupção é necessário um governo forte, que crie instrumentos para restabelecer a ordem. O príncipe não é um ditador, é propriamente um fundador do Estado, que restabelece a ordem onde a nação está ameaçada. Nesse regime Maquiavel o chama de liberdade, onde o povo é virtuoso, as instituições são estáveis e completam as dinâmicas das relações sociais e os conflitos fazem parte das relações sociais, portanto são desejáveis. Segundo o autor esse é o conceito de virtu, que é saber fazer o que é necessário no momento.


Para pensar a virtu e a fortuna mais uma vez Maquiavel recorre aos ensinamentos dos historiadores clássicos, buscando contrapô-los aos conceitos dominantes seiscentistas. Para o antigos a fortuna não era uma força maligna inexorável. Ao contrário, sua imagem era a de uma deusa boa, uma aliada potencial, cuja simpatia era importante atrair como honra, riqueza, glória e poder. Mas fazer com que a deusa da fortuna nos favorecesse e não a outros; como se tratava de uma deusa que era também mulher para atrair suas graças, era necessário mostrar-se vir o homem de verdade virilidade, de inquestionável coragem. Assim o homem que possui a virtu no mais alto grau seria beneficiado com os presentes das representações da fortuna. A força explica o fundamento do poder, porém a virtu é a chave por excelência do príncipe. Sucesso esse que tem uma medida política: a manifestação da conquista. O governo tem de se mostrar capaz de revestir aos inimigos e aos golpes da sorte. O homem de virtu deve atrair os favores da cornucópia (representação da fortuna), conseguindo assim a fama, a honra e a glória para si e a segurança para seus governados.
O jogo entre aparência e essência supõe-se a distinção tradicional entre virtudes e vícios. A virtu política exige também os vícios, assim como exige também o reenquadramento da força. Para Maquiavel o agir virtuoso é um agir como o homem e como animal - "mais vale um leão a mil ovelhas".


A política tem uma ética e uma lógica própria, Maquiavel descortina um horizonte para se pensar e fazer política que não se enquadra no tradicional moralismo piedoso. A resistência à aceitação da radicalidade em suas proporções é seguramente que dá origem ao "maquiavelismo", donde é mal interpretado e obscurece sua riqueza material.


O pensamento político moderno e crítico se faz necessário e é preciso uma releitura, sem preconceito, de sua principal obra - "O Príncipe".

Referência:

QUIRINO, Célia Galvão; SADEK, Maria Thereza (org.). O pensamento político clássico. São Paulo: Martins Fontes, 2003.

sábado, 9 de janeiro de 2016

Os donos do Poder

SOUZA, Laura de Mello e. Raymundo Faoro: Os donos do poder. In: MOTA, Lourenço Dantas (Org.). Introdução ao Brasil. Um Banquete no Trópico, 1. vol.1, 4. ed. São Paulo: Senac, 2004. pp.335-355.


De acordo com Faoro, para se compreender os fatores do poder é preciso partir das relações mercantis e da atribuição de controle do monarca sobre os senhores de terras. Para o autor, as bases do Estado capitalista se assentam sobre a gerência do rei sobre as terras do império. Apoiado na burguesia e com a nobreza, a “empresa estatal” ficou confinada às pessoas que cercavam interesses comuns.
Para Laura de Mello, a estrutura político-social resistiu a todas as transformações, desde D. João I a Getúlio Vargas, prevalecendo traços profundos do patrimonialismo estatal, voltado para a especulação, o lucro e a aventura.
O autor propõe que o estamento, estruturas de classes, é ponto central na compreensão do fenômeno histórico brasileiro, uma vez que o patrimonialismo estatal evoluiu conforme as transformações capitalistas, mas que nunca representou a nação como um todo. 
Na verdade, os grupos e as classes eram furtados da autonomia do senhor de terras. As formações sociais foram pontos de apoio às transformações, voltadas aos grupos que traziam maior montante de recursos ao poder. O que, nas palavras da autora, “a fisionomia era determinada pelo conteúdo do chefe de Estado”, na esperança de um “povo” que empreendia-o como assegurador dos interesses das massas. Nesse sentido, Faoro sugere que o Estado, por sua vez, se manteve, ao longo do tempo, enraizado na retórica do discurso elegante à nação.
Em suma, Faoro faz uma análise interessante. Mesmo com as transformações ocorridas, a tradição histórica aponta para o período atual algumas de suas marcas. De um lado o Estado ainda se apresenta patrimonial, já que defende interesses ligados ao dogma liberal dos empresários, mas que, por outro lado, a disciplina social e jurídica aos “pobres” é a eleição formalmente aceita com a ideia da adesão das massas ao sistema econômico. 
O que se percebe, em toda a parte do texto, é o apontamento de Faoro ao realçar que o Estado, mesmo intervindo em todas as atividades, guarda fortes interesses particulares, indissociável da figura do estamento, que em cada período histórico manteve-se na atenção em empreender determinadas “forças políticas”. Na conclusão feliz de Laura de Mello, “a máquina estatal permaneceu portuguesa, hipocritamente casta, duramente administrativa e aristocraticamente superior”, o que pouco muda a compreensão inicial da obra.

O Abolicionismo

NABUCO, J. O Abolicionismo. São Paulo: Publifolha, 2000. pp. 01-138.

A obra foi escrita em 1883, estando inserida, portanto, em um contexto bastante complexo e conturbado que se consubstanciaria – alguns anos mais tarde – no fim do Império e da escravidão. Nessa época, as influências das ideias racistas e darwinistas eram fortes no pensamento brasileiro. No entanto, o autor tenta demonstrar que a escravidão representa um atraso econômico para o Brasil, além de outras conclusões valiosas, e vai tentar neutralizar as teorias vigentes na época com base na realidade ou seu campo de visão, mas em sintonia com os preceitos liberais vigentes na Europa, por exemplo.
De modo geral, a obra representa um dos marcos do pensamento social brasileiro, pois articula uma visão totalizadora da formação histórica brasileira a partir do regime servil. Nela, estão contidos elementos de fundamental importância para a compreensão do Império, sobretudo da segunda metade do século XIX, bem como apontamentos fundamentais referentes à constituição da população brasileira, a qual o autor distingue como descendente dos escravos.
Assumidamente, a obra é uma propaganda abolicionista, no livro há uma série de denúncias, sobretudo contra políticos e a Igreja católica, que ao contrário de outros países, acabou por legitimar e contribuir para a manutenção do cativeiro. O autor inova ao colocar a escravidão como o aspecto central a ser resolvido. Para tanto, evidencia ser essa uma nódoa que degrada toda a nação, na medida em que está entranhada em toda a sociedade brasileira, que foi essencialmente estruturada tendo como base a escravidão. Ele vai mais longe e aponta como algo terrível a herança deixada pelos portugueses, trazendo consigo o atraso para o país e a visão negativa frente o trabalho. A escravidão, a princípio apareceria como algo positivo, mas com o passar dos anos ela traria prejuízos para o país, levando à bancarrota milhares de fazendeiros, que seriam empurrados para o funcionalismo público.
Vale lembrar que em finais do século XIX, o Brasil era representado, sobretudo pelos viajantes, como um “espetáculo de raças”, ou seja, uma nação multiétnica, que se destacava pela sua coloração mulata. Muitos intelectuais tendiam a utilizar a mestiçagem para explicar o atraso do Brasil e a inviabilidade da nação.
A ideia de um país degenerado pela mistura de raças terá grande força e expansão no período em que foi escrita a obra, porém o autor não se mostra adepto dessa visão, embora às
vezes se simpatize com o racismo. No capítulo denominado “Influências sociais e políticas da escravidão”, o autor já adianta a questão da mestiçagem, como característica típica do Brasil, elemento este que mais tarde será evidenciado por Gilberto Freire em Casa Grande e Senzala.
A escravidão, ainda que fundada sobre a diferença das duas raças, nunca desenvolveu a prevenção da cor, e nisso foi infinitamente mais hábil. O contato entre aquelas, desde a colonização primitiva dos donatários até hoje, produziram uma população mestiça. Apesar de algumas controvérsias existentes acerca da obra, é inegável o fato dela ser referência no campo intelectual brasileiro, uma vez que o seu pensamento propunha, naquela época, uma nova visão de ver a escravidão.
Através da denúncia da escravidão como principal empecilho para o desenvolvimento, em termos econômicos e sociais principalmente, do Brasil e do apontamento das vantagens obtidas com o trabalho livre, o autor consegue evidenciar aspectos importantes da sociedade brasileira de então. Ele ultrapassa a questão do escravismo e levanta o tema da reforma agrária. O autor desenvolve a ideia de que a relação senhor/escravo era essencialmente violenta, oprimindo os cativos e colocando em perigo a sociedade inteira, pois inviabilizava o desenvolvimento da nação. É nesse sentido que ele inova e sistematiza uma série de elementos, tornando a obra um testemunho histórico importantíssimo para o estudo da sociedade brasileira de então, que tinha como pilar de sustentação principal a escravidão, ajudando a compreender as mazelas sociais, causadas pelo preconceito e pelo racismo, que até os dias atuais afligem a sociedade brasileira.

Instituições Políticas no Brasil

ALMEIDA, Maria Hermínia Tavares de. Oliveira Vianna: Instituições Políticas Brasileiras. In: MOTA, Lourenço Dantas (Org.). Introdução ao Brasil. Um Banquete no Trópico, 1.vol. 1, 4. ed. São Paulo: Senac, 2004. p. 293-313.

De acordo Maria Hermínia, Oliveira Viana apresenta em sua obra críticas contingentes aos desacertos da organização política do Brasil. Para ela, desde a constituição de 1824 os comportamentos efetivos se moldaram num tradicional viés de impor fundamentos legais, em consonância com a realidade brasileira.
Para Oliveira Viana, o Brasil tem uma formação histórica específica, em tudo diferente do berço da democracia liberal. A obra do autor chama a atenção justamente nesse aspecto, da distinção menosprezada pelos liberais nativos na formulação de leis, códigos e constituições. A distinção que o autor faz está na não adequação e eficácia das regras jurídicas, uma vez que são pouco atentas à experiência do “povo massa”. Trata-se do desencontro entre dois modos de ser: entre duas culturas políticas diferentes, uma elite metropolitana de idéias pautadas dos grandes centros estrangeiros e da enorme massa rural, imersa em tradições centenárias.
A partir disso, Oliveira Viana parte da noção de que a cultura é fator componente da civilização e da História dos povos. E que as reformas jurídicas e políticas devem partir do florescimento das considerações do “país real”, em sintonia com a experiência histórica e com os complexos culturais por ela gerados, e não da mera imposição elaborada pela elite.
Indo um pouco mais além, a colonização no Brasil produziu duas instituições fundamentais, avessas aos costumes e práticas democráticas: o “clã feudal” e o “parental”. Para ele, o clã feudal se caracteriza nos costumes da grande propriedade rural auto-suficiente, numa estrutura complexa e hierarquizada, onde o senhor do feudo controla sua família e o “povo-massa”, grupo variado e dependente do senhor de engenho, por exemplo (p. 300).
De modo geral, o que o autor quer demonstrar em sua obra é que não se pode fazer uma reforma política que se limite aos modelos estrangeiros. A verdadeira reforma política é lenta e de difícil mudança cultural. Ainda, para ele, a afirmação do Estado como autoridade deliberada nas transformações do país é o elemento central, mas que requer um projeto de nação a construir juntamente com o “país real”, e não na inautenticidade e na falta de nitidez política ou no Estado como ente a favorecer interesses particulares.